Um noite vazia, um ser desperto, confissões do espírito suspensas na brisa.
A lua e as estrelas, minhas únicas cúmplices.
O mundo prossegue o seu curso, indiferente, meramente como se eu não existisse.

sábado, 7 de março de 2009

Estabilidade


Com as mãos cansadas e sem energia retirei um pouco de areia das dunas. Abri a palma da mão e os grãos dispersaram, arrastados pela brisa num dos seus trajectos pela praia.
Um súbito sopro gélido causo-me arrepios e abracei o meu corpo. O vento intenso agitava-me os cabelos cortando-me a visão sobre o mar que o acompanhava, turbulento e monstruoso, lançando para terra gigantescas ondas claras, como na tentativa de afastar potenciais inimigos das águas. Mantive-me firme perante aquelas ameaças, pedindo em simultâneo para que um pouco de calor me encorajasse a não desistir, sabendo perfeitamente que com a chegada da noite o frio avançaria impiedoso sobre mim.
Sentada nas dunas, junto às ervas rasteiras, concentrei o meu olhar no mar deixando-me envolver pela sua música e pelo seu cheiro a sal. O Sol escondia-se atrás das ondas pintando os céus de uma tonalidade vermelha.
Por instastes o meu pensamento divagou para um mundo oculto, no qual nos perdemos facilmente entre a verdade e a mentira. Neste mundo não alcançamos nenhuma conclusão concreta ou concisa, são tudo meras opiniões que guardamos connosco no íntimo do nosso ser.
Sabia que apesar de sozinha, escondida do mundo social, sentia-me completa. Como compensada por algo que os outros dificilmente alcançavam apesar dos seus múltiplos esforços. Sabia que existiam poucas como eu. Pessoas que atingiram a perfeição sem qualquer esforços ou buscas prolongadas. O segredo está em apreciar pequenas coisas que apesar de aparentemente parecerem insignificantes e vulgares, é nelas que reside toda a paz e perseverança que procuramos todos os dias.
Um homem vulgar tem a noção de que ter é poder, por isso o seu passatempo não é mais do que procurar, no mundo comercial, objectos que lhe agradem e confiram poder. Esse poder tem um rótulo de duração, um prazo de validade que ao ser atinguido o objecto é deixado para trás e esquecido. Isto acontece com todos os produtos do mercado. A validade alterna de produto para produto, mas o final é sempre o mesmo. Sendo assim, o homem é um “caçador” de objectos e a sua vida baseasse a isso. O problema é que os objectos não saciam a fome de estabilidade que o homem tanto procura. São apenas “aperitivos” para consular o estômago. Assim, vivemos num mundo consumista que ilude o homem e confunde a verdadeira serenidade.
Talvez seja difícil ao ser humano compreender isto, mas é na natureza que reside toda a perfeição e estabilidade e não no mundo futurista que construiu ao longo das décadas.
Agora sentada sobre a areia fria sinto que encontrei a estabilidade. Um momento que ninguém me poderia roubar, partilhado apenas com as gaivotas que procuravam restos de comida entre os grãos de areia e que por vezes tentavam acompanhar o canto do mar com as suas vozes desafinadas.
Confesso que torna-se um pouco difícil exprimir esta sensação de estabilidade. A única coisa que posso afirmar é que o tempo parece parar especialmente para nós, para que possamos guardar este momento.
Quando o Sol finalmente mergulhou nas profundezas do oceano e a noite se instalou sobre a praia, soube que era altura de partir. Ergui o meu corpo cansado e caminhei pelas dunas temendo voltar ao mundo complexo da sociedade.

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